Enchentes: SP já tem 61 mortos e obras na Marginal ampliam mais as cheias

22/01/2010 17:08:00

Caos em SP

 

A Defesa Civil Estadual de São Paulo informou, em 22/1, que existem mais de 25 mil desabrigados no Estado em decorrência das chuvas que tiveram início em dezembro do ano passado. O número de mortos já chega a 61.  Os temporais, ainda já atingiram 123 cidades – 19% do total de 645 municípios paulistas.

Somente ontem, as chuvas ocorridas na madrugada de quinta-feira (21/1) matou 9 pessoas na capital e Grande São Paulo. O prefeito Gilberto Kassab, procurou  se isentar de responsabilidade, dizendo que “problema dos alagamentos foi o crescimento desordenado da cidade, que impermeabilizou o solo”. Já o governador José Serra foi ao interior entregar ônibus escolares e, segundo a assessoria de imprensa do Palácio dos Bandeirantes, “sobrevoou áreas de alagamentos”, sem precisar horário e local percorrido.

Segundo a Defesa Civil, 25 cidades ainda vivem situação de emergência. São elas: Atibaia, Bofete, Caieiras, Caiuá, Capivari, Chavantes, Franco da Rocha, Getulina, Guararema, Inúbia Paulista, Lucélia, Lourdes, Manduri, Mineiros do Tietê, Mirassol, Osasco, Oscar Bressane, Pardinho, Pracinha, Presidente Venceslau, São José do Rio Preto, São Lourenço da Serra, Santo André, Santo Antônio do Pinhal e Sumaré. Outras duas permanecem em estado de calamidade pública: Cunha e São Luiz do Paraitinga. (http://www.brasiliaconfidencial.inf.br/)

Ampliar a marginal repete erro histórico do urbanismo paulista. Mais enchentes e colapsos do sistema viário

texto de Raquel Rolnik – urbanista (em 10/9/2009)

Um estudo publicado em 9/9/2009, no jornal “O Estado de S. Paulo”, mostrou que a construção de novas pistas na marginal do Tietê terá como conseqüência a redução da área permeável da cidade. É verdade que haverá uma compensação ambiental, mas nem todas as árvores serão plantadas exatamente na marginal.

No mesmo dia o governador José Serra negou que as obras tenham contribuído para o transbordamento do rio, o que não ocorria há dois anos. Segundo ele, a ampliação das pistas não vai tirar um metro quadrado de permeabilidade do solo por causa da compensação ambiental. E o Ministério Público quer paralisar as obras da marginal, que mal começaram.

Em primeiro lugar, não é verdade que a construção de novas pistas na marginal não diminuirá a permeabilidade do solo. A cidade vai sim perder permeabilidade. Com essa obra serão perdidos 19 hectares – como se fossem 19 quadras da cidade de área permeável virando asfalto. A compensação ambiental, por meio do plantio de árvores, não irá compensar isso, pois as árvores serão plantadas em áreas verdes, que já são permeáveis hoje.

Mas é importante explicar que não é só porque perderemos esses 19 hectares que as enchentes aumentarão. No temporal de terça-feira houve sim um volume de água excepcional. Mas volumes de água excepcionais irão acontecer muitas vezes daqui para frente. A principal questão é que quando você coloca todo o sistema viário principal da cidade amarrado em cima dos rios, sempre que há um alagamento ele fica totalmente paralisado.

Por essa razão, o alargamento da marginal do Tietê é um erro urbanístico. É repetir o erro que já foi feito na história da cidade, fazer com que ele seja reiterado. E a prova disso foi a enchente que acabou de acontecer.

Mas não é só isso. Um problema é a área impermeável lá embaixo, ao lado do rio. Outro, mais importante, é a quantidade de área sendo impermeabilizada mais para cima, de onde vem a água que enche o rio. O Tietê tem pelo menos 16 afluentes, e esse volume todo desce das áreas altas, com terra e lixo. Essa mistura vai assoreando os rios e córregos e a própria calha do Tietê e do Pinheiros – e, com cada vez menos chuva, ocorrem mais alagamentos.

Podemos resolver esse problema do assoreamento de duas formas. A primeira é que está na cara que nossa cidade limpa está cidade imunda. A quantidade de lixo aumentou e esse lixo se acumula nos rios. Se o lixo se acumula porque o povo é mal educado, então temos que investir em campanhas, como fizemos com o fumo e com a lei seca, para que as pessoas não joguem mais lixo na rua. Mas é fato que o serviço de varrição foi reduzido, tanto que há um monte de gari desempregado agora.

E não basta apenas manter as galerias limpa, temos que coletar todo o lixo. Não pode haver nenhum pedacinho de papel no chão em lugar nenhum da cidade, incluindo nos assentamentos informais de baixa renda, que também precisam de coleta de lixo.

Outra questão é que existe algo chamado planejamento do uso e da ocupação do solo. Se você ampliar a cidade para qualquer lado, indiscriminadamente, impermeabilizando cada vez mais, teremos cada vez mais problemas de drenagem. É preciso planejar a expansão urbana. E isso é uma coisa que até hoje, na metrópole de São Paulo, simplesmente não existe.

Não há planejamento metropolitano. Cada município faz o que bem entende, não há dialogo entre eles. E os rios, infelizmente, não obedecem a limites municipais. Uma decisão tomada em Cotia ou em Barueri vai interferir naquilo que acontecerá na capital, pois o sistema hídrico é interligado.

O que o caos de terça-feira demonstrou foi que o modelo que vigorou até agora, que é pegar os rios, tamponar, canalizar e colocar todo o sistema viário em cima deles, é um modelo falido. Um modelo que não pode subsistir. Nesse sentido, entendo perfeitamente a posição da Promotoria, que questionou as obra da marginal.

As obras começaram com um licenciamento ambiental feito a toque de caixa, sem um debate adequado, e repetem um erro histórico do urbanismo paulista e paulistano. Isso depois de 450 arquitetos e urbanistas assinarem um manifesto dizendo “não repita, está errado, isso não pode ser feito”, o que foi absolutamente ignorado.

Acho que agora o governador Serra deveria parar um pouquinho para refletir. Em vez de dizer “Vocês querem que a cidade ande de burrico?”, deveria responder à população da cidade de São Paulo com uma alternativa consistente. Porque essa, mais do mesmo, a gente já viu que não vai dar certo.

Site do governo Serra não noticia alagamento das pistas

(Brasília Confidencial – 21/1/2010)

O site da Nova Marginal (http://www.novamarginal.sp.gov.br), criado pelo governo do Estado para dar informações sobre a controversa obra de José Serra nas marginais do rio Tietê, não noticiou que as pistas foram interditadas na madrugada de hoje devido ao alagamento. A obra, prevista para ser entregue em março, prevê a duplicação de 23 quilometro de pistas da marginal. No entanto, o projeto conta com a resistência da maior parte dos especialistas, por julgá-lo prejudicial ao meio-ambiente, ao  impermeabilizar o solo de área inundável. O Sindicato dos Arquitetos de São Paulo chegou a entrar com liminar contra a obra, mas ela foi cassada pela Justiça.

Ocasionado ou não pela construção da Nova Marginal, esta é a segunda vez em pouco mais de dois meses que a marginal do Tietê, cujas obras estão orçadas em R$ 1,3 bilhão, ficou inundada por causa das chuvas. Anteriormente, o transbordamento havia acontecido apenas em 2005, quando o então governador Geraldo Alckmin (hoje secretário de Serra), prometeu acabar com as enchentes através do projeto de rebaixamento da calha do rio, ao custo de mais de R$ 1 bilhão na época.

A Nova Marginal é considerada um projeto eleitoreiro do governador José Serra e tem sido muito criticada por arquitetos e urbanistas. Eles chegaram a elaborar um manifesto, que já conta hoje com 1.600 assinaturas, repudiando a obra. Uma das signatárias, professora Ermínia Maricato, considerou o projeto como “irracional e incompreensível” e declarou em dezembro de 2009 para o Brasília Confidencial em dezembro que não entendia como “as secretarias estadual e municipal do Meio Ambiente haviam permitido realizar uma obra com estas características”

 

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